Cada macaco no seu galho

Não se pode negar ou virar rosto: a questão do racismo é ampla e complexa, variando em sua intensidade e forma. Aprofundar-se no tema é algo extremamente delicado para quem nunca viveu na pele, literalmente, essa forma de preconceito. Por isso, o que se questiona aqui é a mais recente campanha #somostodosmacacos que, travestida de anti-racista, ganhou as redes sociais em pouco tempo.

as redes sociais pipocam com a recente “glamourização” em ser macaco

O que causa estranheza é o discurso destoante dos demais. Enquanto há tempos se luta contra a associação nefasta de que alguém possa ser comparado à um macaco, em clara alusão de que a pessoa é um ser inferior (e aqui não importa se você acha qualquer animal um ser superior, mas o que a mensagem carrega), de um outro lado as redes sociais pipocam com a recente “glamourização” em ser macaco.
 

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Viajemos para os Estados Unidos da América, onde o preconceito é tão latente como no Brasil, apenas não é tão velado quanto. “Nigger” é um termo pejorativo, utilizado desde a época escravagista, que sempre diminuiu aqueles de pele escura nas terras do Tio Sam. Com o crescimento das comunidades negras e guetos, o termo “nigger” tornou-se uma gíria comum entre os membros dessas comunidades, um cumprimento. Mas se dito por um branco, é uma ofensa grave. O termo é considerado um tabu tão grande, que o diretor Quentin Tarantino recebeu duras críticas no seu filme “Django Livre” (que se passa na época escravagista), onde a palavra é repetida várias vezes. Mas por que? E onde entram as bananas e os macacos?

A mensagem que você transmite vêm acompanhada de tudo aquilo que você representa. Um negro americano que refere-se à outro por “nigger” compartilha a mesma carga histórica e social de preconceito, pode até mesmo ser uma forma inconsciente de ambos se conectarem nesse aspecto. Um branco que repete o ato jamais foi um “nigger”, jamais teve que ouvir alguém resmungar o termo de canto de boca, resumindo toda sua pessoa à uma única expressão que carrega todo o desprezo concentrado.

A mensagem que você transmite vêm acompanhada de tudo aquilo que você representa

Somos todos ‘viadinhos’? Somos todos ‘vadias’? Não somos todos nada disso, nem outras inúmeras coisas, muito menos macacos. Grande parte de nós não sabe e jamais saberá o que é realmente ser chamado de “macaco”. De repente, não há mais nada de errado em ser xingado de “macaco”, afinal todos também somos, correto? O que todos nós somos é racistas, como bem pondera a professora Renísia Cristina:

http://youtu.be/kezq5RweOz8

Além do tiro que sai pela culatra, a campanha sequer é fruto de uma ação espontânea, mas sim de uma bem pensada jogada publicitária como podemos ver em notícias como essa ou em opiniões que a analisam mais à fundo, como a do jornalista Renato Guimarães.

Ao ser alvejado por uma banana – e tudo o que ela significa – Daniel Alves a comeu, em forma de ignorar e menosprezar o xingamento. Horas depois, a mesma expressão que vem carregada de significado negativo (apesar das reais boas intenções de muitos que a repassam) recebeu uma hashtag e alcançou status de moda.

Então todos são macacos, mas, sempre que possível… um daqueles bem branquinhos; sem preconceitos, claro, é só que eles parecem mais limpinhos e fofos.

E cada macaco continua em seu galho.


perfilDaniel Serrano é formado em direito, advogado, adora video games e não sabe o que é sofrer racismo.

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