A crueza da vida não cabe na armação das pegadinhas do SBT, mas cabe no Evangelho.

Jesus, UFC e Ivo Holanda

[dropcap1]S[/dropcap1]e você nasceu nos anos 80, sabe o que é ficar a semana inteira esperando pelo Domingo à noite, ligar no “Topa tudo por Dinheiro” e morrer de rir com as pegadinhas do Ivo Holanda.

No estrangeiro, a mais famosa (talvez pioneira) é a Candid Camera. Aqui no Brasil, o gênero voltou ao universo popular com as “Pegadinhas do João Kléber”.

Um fato curioso em relação às tais “Pegadinhas do João Kléber” é que chega a ser gritante a armação de tudo. As demais não se tem certeza, mas as referidas eram inteiramente combinadas; que, se você raciocinar do ponto de vista jurídico e médico faz sentido, pois apenas um episódio de azar (um ataque cardíaco de uma vítima de susto, por exemplo) poderia arruinar todo o esquema de entretenimento.

Já encontrei pessoas assistindo à tais pegadinhas, sabendo se tratar de algo puramente teatral, mas rindo honestamente e ainda comentando entre uma risada e outra: “E o pior que isso tudo é combinado!”

O primeiro impulso é já interpelar a pessoa: “Mas se você sabe que é combinado, por que você assiste?”.

É o mesmo princípio de quem assiste WWE (World Wrestling Entertainment), o fã de UFC pode não entender como alguém assiste uma luta toda combinada (não irei entrar no mérito do UFC ser combinado ou não, hahahahaha).

Aí você para um instante e pensa que a maioria das formas de entretenimento: mágica, cinema, teatro, shows musicais, etc., são, em algum nível, combinadas.
E sabe o que diferencia elas da pegadinha? Nada (fora o fato da pegadinha se vender como espontânea, hehehehe).

O ponto central em rir de uma pegadinha sabendo que é combinada, vibrar com uma cotovelada voadora no WWE, acreditar que aquela piada genial foi de improviso é só um: dar uma trégua na realidade, em maior ou menor escala.

[quote_right]É ESCOLHER SER ENGANADO. Preferir fechar os olhos para a realidade em prol de seu prazer.[/quote_right]
É ESCOLHER SER ENGANADO. Preferir fechar os olhos para a realidade em prol de seu prazer. É preferível assistir a uma luta em um WWE ou no UFC a uma luta de rua. Nas duas primeiras situações sempre há uma zona de segurança, no WWE por ser tudo ensaiado e no UFC por existirem regras já combinadas, as quais o lutador não pode violar.

Em uma briga de rua tudo é muito feio, geralmente não há técnica, é cru e com um perigo real. Por mais fã da violência televisiva que você seja, um ferimento ou morte real é perturbador de se assistir, jamais entretenimento (se você é psicopata e está lendo isso, ignore).

Recentemente, o Fantástico lançou um quadro chamado Vai fazer o que?, que se aproxima mais do que seja uma “pegadinha real”.
Situações de humilhação, preconceito e violência, mais facilmente geram reações de indignação e ajuda do que contemplação ou diversão.

Pois essa mesma lógica aplica-se ao nosso querido e bom Evangelho.
A vida proposta por Cristo assemelha-se muito mais à uma briga de rua: é crua, direta, dolorida e nos estimula muito mais a levantar e agir que a sentar e contemplar.

Dessa forma é até compreensível (jamais justificável) a tendência que temos em escolher ser enganados.
Queremos a versão combinada do Evangelho.

É a pegadinha de Jesus! Ié-ié!

Cada um sabe o papel que deve desempenhar, é o “script” que atrai. Tudo delineado e definido, com as horas determinadas de chorar, rir, surpreender-se, amar, odiar, ajudar, contemplar, receber, etc.

Eu cumpro exatamente a minha parte, quem senta ao meu lado cumpre a dela e todos seguem o roteiro (escrito por nós). Dessa maneira todos temos o controle do barco e não precisamos confiar no Jesus que dorme enquanto o mar está revolto, apesar de ocasionalmente alguém ainda ponderar: “- E o pior que isso tudo é combinado!”

Temos agido como um time de baleado (ou queimada, para os não-nordestinos):
Uns poucos na posição de ataque, segurando a bola, com a possibilidade de passá-la adiante, fazer algo; mas a maior parte permanece no “mofo”, gritando em uníssono:

-COMBINA!